quinta-feira, 14 de junho de 2018

O QUE É DOR MIOFASCIAL?

O QUE É DOR MIOFASCIAL?

Em primeiro lugar, é preciso entender o significado do termo miofascial.

Você já foi à um açougue comprar uma peça de filé mignon, de contra filé, de alcatra ou qualquer outra, não? E aí você pede para o atendente uma carne limpa, certo?


Antes de mais nada, o açougueiro começa por retirar uma “pele” que envolve os músculos e que isola os mesmos uns dos outros. Essa “pele” é um tecido conjuntivo que envolve, não só os músculos, mas todas as estruturas do organismo de maneira tridimensional, da cabeça aos pés, incluindo os ossos, nervos, vasos sanguíneos, e até mesmo as células.

Essa “pele” se chama fáscia. Na extremidade dos músculos, a fáscia se une e forma os tendões, de cada lado do músculo. Estes tendões vão se fixar em ossos ou em articulações, e quando há contração muscular ocorre o movimento.

Tomemos por exemplo o músculo bíceps braquial. Seu tendão da parte de cima se une à parte anterior do ombro, enquanto o tendão inferior se une ao rádio (osso do antebraço). Portanto, o bíceps percorre 2 articulações, a do ombro/braço e a do braço/antebraço. A contração do bíceps irá promover a flexão do antebraço sobre o braço e auxiliar outros músculos na flexão do braço sobre o ombro.

“Mio” significa músculo, e daí o termo miofascial (de músculo e fáscia).

SÍNDROME DE DOR MIOFASCIAL

É a que decorre do comprometimento funcional dos músculos e fáscias. No interior dos músculos se forma uma banda tensa, que pode doer espontaneamente ou não, e quando comprimida de forma adequada, provoca dor no local ou referida à distância deste ponto. Travell (Travell J. & Simons, D - Dor e Disfunção Miofascial - Manual de Pontos Gatilho. Artmed, 2ªd. Porto Alegre, 2005) o denominou Ponto Gatilho Miofascial (Trigger Point). Os pontos gatilho podem estar latentes ou ativados, e nesta última condição são responsáveis pela dor.

Não se surpreenda se nunca ouviu esses termos antes. Muitos profissionais desconhecem seu significado, ou pelo menos a importância que a dor miofascial / pontos gatilho têm na gênese das dores músculo esqueléticas. Mesmo a Organização Mundial da Saúde subvaloriza a dor miofascial, a tal ponto que a mesma não tem codificação na Classificação Internacional das Doenças (CID), embora Travell venha descrevendo a síndrome desde a década de 1950.

Assim, por exemplo, o médico que diagnostica uma síndrome miofascial num paciente é obrigado a usar os códigos R52 - dor não classificada em outra parte, ou M79 - outros transtornos dos tecidos moles não classificados em outra parte, M79.0 - reumatismo não especificado, ou ainda M79.1 – mialgia, que constam da CID 10, nenhum dos quais identifica a síndrome!

Segundo Travel, 80% de todas as dores do sistema ósteo músculo articular são devidas a pontos gatilho ativos. Os sintomas surgem devido à disfunção do complexo de músculos e fáscias! Por outro lado, muitas dores com origem em estruturas lesadas tem um componente miofascial supra ou subjacente que podem agravá-las.

A SÍNDROME DE DOR MIOFASCIAL É MUITO POUCO RECONHECIDA E INADEQUADAMENTE MANEJADA

A falta de achados laboratoriais ou nos exames de imagem que possam comprovar alguma alteração orgânica justifica o fato da dor miofascial situar-se entre as condições clínicas mais mal diagnosticadas. O distúrbio é da função, e não estrutural. Recentemente, demonstrou-se que a termografia é capaz de identificar pontos gatilho ativos, mas este recurso diagnóstico está disponível apenas em algumas instituições de pesquisa, e o clínico não pode contar com ele.

Por enquanto, na prática diária, somente a história clínica e o exame físico cuidadoso, incluindo palpação e exame funcional, será capaz de identificar a síndrome. Entretanto, isto não exclui a responsabilidade do profissional de afastar causas estruturais que possam ser responsáveis pelo quadro que o paciente apresenta.

Costumo receber em meu consultório pacientes a quem pergunto qual a queixa principal que o trouxe a mim, e eles respondem: “tenho hérnia de disco lombar”. “Mas o que você sente, é isso que me interessa”, torno a perguntar, e o paciente então compreende que desejo saber seus sintomas, geralmente dor. Onde se localiza? Se irradia? Quando iniciou, foi de forma insidiosa ou abrupta, melhora ou piora em qual posição, usou medicamentos, etc.?

Texto a mobilidade do paciente e o examino, e ao fim tenho a responsabilidade de afastar ou valorizar a tal hérnia de disco como responsável pelo que o paciente apresenta. E posso garantir que na maioria das vezes, a hérnia no máximo pode predispor o surgimento de uma síndrome miofascial, que é, de fato, a responsável pelos sintomas, e não a hérnia. Tanto assim que o paciente fica bom, sem sintomas, e a hérnia de disco permanece.

É claro que existe a dor causada pela hérnia, e cabe ao profissional identificar quando isto ocorre. Ainda assim, a conduta em princípio é conservadora, e a acupuntura pode mitigar os sintomas. Acrescento ainda a informação de que mais da metade de pacientes acima de 40 anos é portadora de hérnia de disco, e a maioria é assintomática.

FATORES DESENCADEANTES DA DOR MIOFASCIAL

A dor miofascial pode ter origem em estruturas somáticas (músculos, ligamentos, ossos, articulações) ou viscerais (órgãos internos).

Contratura muscular em excesso (carregar peso), manter músculos permanentemente contraídos (uso de bolsa a tiracolo contrai o trapézio superior e o levantador da escápula) ou alongados, movimentos repetitivos (uso do teclado, do mouse), posturas inadequadas (ao ler, sentar, posição de dormir), restrição dos movimentos (como em imobilizações), distúrbios articulares, processos inflamatórios, etc., enfim, qualquer condição que promova stress biomecânico pode ativar pontos gatilho e promover o surgimento de bandas tensas no interior dos músculos.

O stress (pressão do trabalho, cumprir metas) por si aumenta a atividade elétrica do ponto gatilho miofascial e pode gerar a síndrome.

Um exemplo de distúrbios viscerais gerando dor miofascial é a crise causada por um cálculo renal que desce pelo ureter, distendendo as estruturas do sistema urinário, o que é responsável pela dor. Os reflexos que existem entre as vias nervosas viscerais e somáticas no nível da medula espinhal produzem contração da musculatura lombar, o que aumenta ainda mais a dor. O cálculo pode ter sido expelido, a crise devida à passagem do cálculo pelas vias urinárias pode até ceder, mas o paciente muitas vezes persiste com dor na região lombar, agora causada pela síndrome de dor miofascial.

Dor na musculatura abdominal alta pode estar associada a distúrbio da vesícula biliar, do esôfago, ou do estômago; na parte baixa do abdome pode refletir distúrbios intestinais, dismenorreia (menstruação dolorosa). O exame cuidadoso irá identificar a presença de bandas tensas e pontos gatilho no músculo reto do abdome.

Assim, os pontos gatilho podem complicar qualquer tipo de dor e mesmo sugerir distúrbios viscerais subjacentes.



EXEMPLOS DE DOR MIOFASCIAL


Muitas das condições dolorosas citadas abaixo são primariamente miofasciais. Outras se acompanham de distúrbios na estrutura músculo esquelética, que podem ser a consequência ou a origem das dores miofasciais. Em qualquer dos casos, essas dores são tratadas com sucesso pela acupuntura.

ü  Dor no pescoço e na cintura escapular, incluindo torcicolo.
ü  Dor no dorso.
ü  Dor no ombro (traumas, síndrome do manguito rotador, ombro congelado).
ü  Dor no cotovelo (cotovelo de tenista, cotovelo do golfista, dor no olecrano).
ü Dor no punho (síndrome do túnel do carpo, síndrome do canal de Guyon, síndrome De Quervain).
ü  Dor na mão.
ü  Dor nos dedos da mão e dedo em gatilho.
ü  Dor lombar aguda ou crônica.
ü  Dor ciática.
ü  Dor na articulação do quadril.
ü  Dor na articulação sacro ilíaca.
ü  Dor na coxa.
ü  Dor no joelho.
ü  Dor no tornozelo.
ü  Dor no pé, incluindo devido à Neuroma de Morton.

Fonte: Dr. Marcio Dias, Phd.

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